Desabafo
Há poucos meses das eleições, penso na hipocrisia como as pessoas se atiram e se atrevem em busca do poder. Num país já tão assoberbado de feridas e cicatrizes, em função da epidemia da corrupção, fica quase impossível imaginarmos quem poderá nos representar, sem nos causar mais prejuízos não só materiais, porém, sobretudo, emocionais, que, sem dúvida, podem tornar-se um verdadeiro calvário. Penso no que vejo no Rio: nas obras por muitos bairros, outros esquecidos, sem rede de saneamento básico; nas pessoas habitando lugares que, sequer, servem de abrigo para animais; nas favelas que crescem dentro de bairros, até de classe média alta; na quantidade de guardas municipais, como antes nunca se viu, e são tantos, que parecem perdidos, enlouquecidos, atrás de multas, única ocupação que lhes compete; nas UPAs, sem médicos suficientes, para atenderem aos mais carentes; nos enfermos largados nos corredores hospitalares; nos hospitais antigos depredados; no grito desesperado da médica que dizia sentir-se sozinha, para atender a tanta gente necessitada; na ausência de hospitais que atendam, especificamente, a tal falada "melhor idade"; nos prédios históricos, devastados pelo tempo; nas crianças e moradores de ruas espalhados, principalmente, pelo Centro do Rio; nas ações imediatistas que literalmente "cobrem o sol com a peneira"; no crack, que tem devorado almas ou fazem das pessoas verdadeiros "zumbis ambulantes"; na inauguração de escolas e creches e as que estão em pé, completamente esquecidas; nas mentiras sobre a aprovação automática; nos últimos elogios feitos por Eduardo Paes à secretária Claudia Costin, consequentemente, à educação do Rio, mas nenhum deles coloca seus filhos ou netos para estudar na classificada melhor escola deste Município.
Penso nas promessas que ouvimos nas eleições passadas; na rixa entre o criador e sua criatura, respectivamente, Cesar Maia e Eduardo Paes; nas críticas e nas alianças oportunistas de partidos opostos; nas UPPs e na imagem dos bandidos fugindo, sabe-se lá para onde; na morte de policiais e no abuso de autoridade de muitos deles; no dinheiro público gasto, de forma exagerada; nos péssimos salários que os servidores recebem.
Penso nos sofismas e na falta de pudor dos políticos; em como milhares de pessoas têm sido massacradas por não terem acesso ao básico de uma educação, ao básico da cidadania; na pseudo-inclusão de deficientes e na completa ausência de políticas públicas, que norteiem o processo de interação e sociabilização desses indivíduos; na falsa paz de nossa Cidade, alardeada aos quatro ventos por muitos; em como as pessoas se vendem por cargos ou salários.
Agora, penso em mim, como ser humano, profissional e professora, que reinventei no município, dentro de minhas salas de aula, a forma mais eficaz de ensinar língua portuguesa a alunos que mal sabiam assinar o nome, quando chegavam ao antigo ginásio.
Penso nos projetos e oficinas de Jornal Escolar e de como era prazeroso estar ali , ensinando e aprendendo, até março do ano de 2011, quando fui ameaçada por uma avó que acreditou na "mentira" de seu neto e jurou que mandaria me matar.
Sim... esse foi o preço que paguei por ter dedicado anos a fio a uma escola municipal, situada numa área de conflito, mas que, até aquele momento, eu tinha muita alegria de trabalhar. Penso em tudo o que passei, na omissão da direção e também da CRE a que pertenço. Hoje minha saúde não me permite mais estar em sala de aula. Na época fiquei muito doente e ainda me encontro em tratamento. Fora do ofício de ensinar, vejo minha vida profissional como num filme, correndo de um lado para outro, chegando a lecionar em quatro escolas, para poder viver de forma digna e feliz.
Por tudo isso, tenho pensado na ganância, na hipocrisia humana que, de uma forma ou de outra, destroem a vida de pessoas, que ainda acreditam em palavras, em promessas de políticos oportunistas, sem caráter, capazes até de beijar as mãos e dar abraços naqueles que, um pouco mais adiante, serão a carniça dos abutres inescrupulosos que estarão no poder.
Finalmente, penso na fórmula mágica que poderá - ainda- ser descoberta, para que a sociedade seja mais justa, solidária e que o bem-comum seja exclusividade de todos e não somente para aqueles que brincam de ser Deus.
Professora Bernardete Ribeiro - 06/08/2012
Há 12 anos
Nenhum comentário:
Postar um comentário